!!Se arrependimento matasse... ou: “Ok Computer” fez 10 anos!! Rod Castro

27 de fev. de 2008

Quantas vezes em sua vida você teve uma grande oportunidade e a desperdiçou? Várias com certeza. Desde uma vaga de emprego. Passando por um encontro em que você chegou atrasado. Uma amizade que poderia ter sido feita. Outra que sempre deveria ter sido desfeita. E terminando com aquele disco que você ouviu e odiou de primeira.

Todos os dias, essas situações ocorrem e a tal frase, mais cedo ou mais tarde, será proferida pelos seus lábios com certo rancor ou até mesmo melancolia: “Ah se arrependimento matasse”.

Há mais de dez anos, proferi com orgulho essa frase. Após ler a minha Showbizz e gostar muito de um artigo feito pelo Zeca Camargo – você não está lendo errado, é o Zeca do Fantástico mesmo – sobre o novo disco do Radiohead – banda que me era mais conhecida pela excelente música “Creep” – “Ok Computer”.

O texto era tão bem feito que não pensei duas vezes: fui a uma loja que importava CDs – no tempo que o dólar tava um por um – e fiz minha encomenda. Dali a duas semanas aquela maravilha estaria em minhas mãos e faria parte de minha pequena, mas boa, coleção de CDs de rock.

Ouvindo mais um disco do Led Zeppelin, sou chamado pelo dono da loja para pegar o meu “Ok Computer”. Ansioso, separo o discman – lembra disso? – ponho CD pra rodar. Vou ouvindo as canções até chegar em casa. Dou o eject de um aparelho e coloco-o no meu aparelho de som.

Ouço uma, duas, três vezes. Leio duas vezes o artigo e chego ao veredicto: uma porcaria, o Zeca me enganou. Ligo para a loja, falo com o dono, pergunto se há possibilidade dele devolver metade do dinheiro se eu devolver o CD, ele concorda. Separo o disco e no caminho para a loja, arrisco a colocar a porcaria no discman, por total sorte, vou direto para “Paranoid Android”.


“Please Could You Stop The Noise. I Try to Get Some Rest” implora uma voz sofrida enquanto violões e uma sutil bateria fazem uma parede melódica de fundo. Outra frase da mesma canção me interrompe no caminho a loja: “Whats There? Whats There?”. Sentei na calçada e comecei a me perguntar: o que era aquilo?

Antes de chegar a uma conclusão real a voz sentencia: “Ambition Makes You Look Pretty Ugly. Kicking, Squealing gucci little piggy. ”. E as coisas começaram a abrir em minha cabeça. Aquilo era a resposta contra a mesmice que o roque havia se tornado após Seattle. Esse CD era a volta do que realmente prestava no estilo que sempre mais gostei: renovação e experimentalismo junto a excelentes letras e uma produção impecável.

Eu não sabia – mas muita gente que comprou “Revolver” e “Physical Graffiti” antes de todo mundo também não deveria saber - mas ali em meus ouvidos eram tocadas as melhores músicas daquele ano e olha que o Depeche Mode já havia voltado das trevas e feito o excelente “Ultra”. Mas “Ok Computer” ia além: viajava pelo espaço sonoro em “Subterranean Homesick Alien”, relembrava o Queen, com a já citada “Paranoid Android” e ainda fazia uma das canções mais tristes que ouvi em minha vida: “Exit Music (For A Film)”.

E olha que não chegamos nem a metade do disco. Levantei da sarjeta, sorri comigo mesmo e fui fazendo o caminho de volta para casa. De repente uma chuva caiu, como se me limpasse e imediatamente outro trecho de “Paranoid Android” em que Thom Yorke suplica por ela “Rain down, rain down. Come on rain down on me. From a great height. From a great height... height...” me veio a lembrança.

Sem nem mesmo dar o pause, fui me secando com uma toalha e lembrando de que um dia fui criança, daquelas que corre para o pátio quando a chuva cai e toma um banho daqueles enquanto ouvia a maravilhosa, melancólica e desafiante “Let Down”.

Stop. Eject. Tira o CD. Põe o CD no aparelho de som do quarto. Aperta o play. Pula para a faixa 6 e um mantra começa a ser emitido, “Karma Police”. A música é tranqüila, sua letra é pessoal e com certeza ali, naquela linda canção, no momento em que o som pára, é que tive discernimento do quanto aquele disco – sou velho e nesse tempo as pessoas nem sonhavam com o MP3 – seria importante para dezenas de outras bandas.

A fórmula “piano, voz amargurada, cantor com estilo excêntrico de cantar e subida de tom em momento chave da canção” seguida por Keane, Coldplay, Muse e muitas outras foi criada em “Karma Police”.

Você pode reclamar da informatização de “Fitter Happier”, da “pauleira” de “Electroneering”, da canção perfeita para um filme de David Lynch (“Climbing Up The Walls”), da segunda viagem espacial da banda em “Lucky” e da nostalgia de “The Tourist”. Mas todas essas faixas são necessárias para que o sentido de se ouvir um dos melhores discos de roque já feitos seja completo.

E olha que eu não vou nem falar de um clássico instantâneo que se chama “No Surprises”, talvez a mais linda canção já feita por uma banda nos últimos 30 anos e que tem tudo para entrar em uma daquelas compilações das “músicas mais marcantes de cada década”.

Escrevi todo esse texto para você: que não conhece esse material do Radiohead, que é apaixonado por Keane, Coldplay e Muse, que quer ouvir algo diferente, moderno e que possa inspirar você por alguns bons minutos da sua existência. E também porque não vi nenhum, se tiver favor indicar, artigo do ano passado que falasse de “Ok Computer” em pleno seus dez anos de lançamento.

Ouça sem alarmes e tenha muitas surpresas.