!! Como fazer dois excelentes discos seguidos, ou: “Only By Night” do Kings Of Leon!! By Rod Castro

14 de out. de 2008


Vou ser bem direto logo nessa primeira linha: o novo disco do Kings Of Leon, “Only By Night” me emociona, muito. É de uma melancolia tamanha que me faz pensar que hoje, ao voltar do trabalho, vou ligar no canal 02, TV Cultura, e assistir a mais um episodio de “Anos Incríveis”.

Mas entenda, não é uma melancolia de querer voltar no tempo, na verdade é um sentimento de que o tempo já voltou e eu que passei para outra etapa da vida. Poucas bandas conseguem fazer isso com os ouvintes, hoje em dia então, nesse marasmo de coisas “novas” e repetitivas, é que não rola mesmo.

Mas com o Kings Of Leon a coisa é diferente. Após terem acertado na mira ao gravarem o excelente “Because Of The Time”, no ano passado, eles extrapolaram tudo o que você pensa a respeito da banda com esse, já clássico, “Only By The Night”. Parece que a fórmula de desconstruir o ritmo que te influencia para criar algo novo – no caso deles, bandas como Bread e Creedence Clearwater – seguido no trabalho anterior foi exercitada ao extremo pela banda e resultou no melhor disco desse ano de 2008 – com sobras perante demais artistas.

Se você achava estranho uma banda, além do Interpol, começar seu novo CD com uma canção inclassificável como “Knocked Up” em “Because...” , o que você dirá ao ouvir, a também inclassificável “Closer”? Ou a barulhenta, como um Creedence com a guitarra do Black Sabbath – e dona do melhor baixo de todo o CD – “Crawl”?

No mínimo você vai se perguntar: onde está a tal melancolia que o autor tanto falou?

Mas sua pergunta será atropelada pela dançante, grudenta e uma das melhores canções com potencial imenso para se tornar hit do ano, “Sex On Fire” – que tem um trabalho de construção sonora interessante.
Após muito bate pé e simulações de solos de guitarra da sua parte - “Sex On Fire” tem esse efeito arrebatador - você vai mergulhar em um túnel do tempo e voltar mais de uma década em sua existência, com as sensacionais “Use Somebody”, “Manhattan” e “Notion” e terá a emoção presente na sua audição com as mais belas canções do ano: “Revelry” e “17”.

Para descontrair desse sentimento antiquado, ou até mesmo para se juntar ao panteão de grandes bandas descompromissadas, que fazem algo para “ficar na eternidade sonora dos entendidos”, o Kings coroa sua obra com a gostosa “I Want You”, a marcante e ritmada “Be Somebody” e termina esse discão de maneira retumbante e até mesmo avassaladora com “Cold Desert”.

“Only By Night” é um compromisso assumido pela banda junto aos seus fãs e admiradores: de que esse é apenas o segundo de vários bons discos que virão. Perfeito, o melhor disco do ano de longe... nota 10,0!

!!O Cinema autoral ou apenas um bom diretor no comando... ou: “Senhores do Crime”, “Blindness”, “Sicko” e “Eu Não Estou Lá”!! por Rod Castro!

8 de out. de 2008

O cinema autoral até hoje é discutido pelos entendidos da sétima das artes e defendido ao extremo por fãs e diretores que desejam algo a mais quando decidem parar suas vidas para assistirem a um filme. Mas o que faz um filme autoral? Sem procurar definição nos livros ou no Google me arrisco a dizer que seria um filme que nasce e se desenvolve na cabeça de um cidadão.

Ou seja, ele faz o roteiro, desenvolve a produção e finaliza o filme. Levando-o direto para a apreciação de seu público de forma única, sem alteração ou sugestões de engravatados pelo caminho. É um estilo mais dificultoso de se fazer uma obra cinematográfica, mas bem mais original.

Nesse estilo de trabalho, você, o autor/diretor não conta com outra cabeça para fazê-lo mudar o foco ou o estilo da obra – isso é bom (?). Ao mesmo tempo, você passa tanto tempo ligado àquela história que se funde com o enredo de tal forma, que acaba fazendo mais do que faria se tivesse sido contratado para fazer aquele filme encomendado diretamente por um grande estúdio.

Hoje, poucos profissionais da direção realmente são autorais. As pessoas confundem assinatura – um estilo de direção – com um trabalho autoral – aquele que fundamenta passo a passo o que será feito por todos os dias de pré, produção e pós.

Outra coisa importante de se falar é que a interferência do diretor, de forma intensa, no roteiro, não credencia tal trabalho, como autoral. Longe disso, sua intromissão no texto que conta a história é no mínimo uma de suas funções e sempre o é cumprida com ajuda de mais algumas pessoas, como produtores e roteiristas, às vezes até mesmo o autor do livro – casos raros.

O que me incomoda com relação a esse paradigma, (ou seria uma onda surfada por pessoas mais cultas?) de que cinema autoral é melhor que o comercial, é a pompa com que certos projetos são vendidos perante público. De uns tempos para cá isso vem se tornando mais marketing do que qualidade. Um dos exemplos que não me canso de citar é o do indiano M. Night Shyamalan.

Após fazer um filme interessante no início de sua carreira – filme esse que eu não tenho tempo agora para lembrar (leia-se pesquisa Google de novo) – o promissor diretor partiu para o cinema autoral e acertou de primeira com o excelente “O Sexto Sentido”. Após receber o reconhecimento da crítica e do público, Shyamalan deu mais um passo rumo ao status de diretor auto-suficiente ao realizar, o sempre, subestimado “Corpo Fechado”.

Com certeza apareceram outros trabalhos, maiores e de encomenda, para que o indiano fizesse. Mas ele não topou – um deles, alguns colunistas afirmam, foi o novo filme do “Superman”, que acabou sendo feito pelo também competente Bryan Singer – e preferiu dar o pontapé em mais um filme com a sua “fórmula” de criar histórias – em que um mistério vai sendo desvendado durante a projeção e você, público, só consegue notar ao final, quando ele junta as peças - o subestimado “Sinais”.

Mas a partir daqui M. pisou na bola, em minha opinião. Confundiu estilo, com autoral, e se repetiu. “A Villa” é um bom filme, mas não tem mais aquela originalidade que conquistou milhões de espectadores e milhões de dólares para os estúdios que o produziam. Pelo contrário, ao final da exibição, era uníssono o comentário vindo da platéia, de que a obra era repetitiva.

“Dama Na Água” foi à saída certa para Shyamalan voltar a ser autoral – filme esse massacrado pela crítica por um personagem que mostra uma das várias formas de se analisar uma obra da sétima arte, um cri-crítico, que morre durante a exibição. Mas a decepção voltou a se repetir com o fraco, ralo, bobo e pior filme do excelente diretor autoral: “Fim dos Tempos”.

E porque estou falando tanto de cinema autoral e estilo de direção? Simples, quatro filmes que estrearam, ou chegaram às locadoras, recentemente, dão mostras de bom cinema. Alguns autorais, outros com bons diretores a frente do projeto, mas não autorais. Vamos notar as diferenças? Sigamos.

“Senhores Do Crime” - David Cronenberg merece respeito. O canadense que dirigiu filmes tão distintos, originais e inclassificáveis como “Scanners”, “Videodrome”, “Na Hora da Zona Morta”, “A Mosca”, “Gêmeos, Mórbida Semelhança” e “Crash, Estranhos Prazeres”, tem muito ainda para mostrar.

Está certo que em “Marcas da Violência” houve uma supervalorização do seu estilo de fazer filmes. Mas nesse simples e competente “Senhores do Crime”, que nem pode ser classificado como policial ou como drama, ele mostra que uma coisa ele sabe fazer muito bem: dirigir atores.

Se muitos adoraram o personagem feito por Viggo Mortensen em “Marcas”, aqui nesse interessante “Senhores Do Crime” o ator demonstra que caracterização é uma de suas principais armas ao realizar mais um grande trabalho. Naomi Watts não sai atrás, com sua enfermeira que mora na Rússia e encontra o diário de uma prostituta que deu a luz a uma criança que deveria estar morta.

Mas, assim como Ed Harris em “Marcas”, o papel de destaque vai para o veterano ator alemão Armin Mueller-Sthal e seu enigmático e ao mesmo tempo aterrorizante Simon/Semyon. O filme proporciona boas cenas, sendo que com o estilo de trabalhar de Cronenberg, você já espera por uma briga inusitada – e a terá, dentro de uma sauna. Nota 8,0!


“Ensaio Sobre a Cegueira” – Cinema autoral no Brasil, incrivelmente tem uma relação estranha com o nome de um diretor: Fernando Meirelles. E porque estranhamente? Simples, nenhum dos últimos três filmes de Fernando são roteiros originais, pelo contrário, são adaptações de conhecidos livros, como “Cidade De Deus” (do brasileiro Paulo Lins), “O Jardineiro Fiel” (do inglês John Le Carré) e agora, “O Ensaio Sobre a Cegueira” (do português José Saramago).

E aqui nesse complexo drama/ficção escrito pelo ganhador do Prêmio Nobel parece que Fernando derrapou. Não, o filme tecnicamente não deve nada aos trabalhos anteriores do excelente diretor brazuca. A fotografia, edição, o elenco e até mesmo o som merecem respeito. Mas faltou algo, algo que somente a direção podia trazer ou fazer acontecer na tela grande: conjunto.

Filme que possui muito destaque, não possui todo. E filmes que possuem todo são melhores e oferecem mais, como “Cidade de Deus” e “O Jardineiro Fiel”. Bom filme, com grandes momentos, mas não é a obra-prima que devia ser – ainda mais pelos nomes envolvidos. Uma pena, mas ainda assim forte e de respeito. Nota 8,0!

“Sicko” – Se você trabalhasse em uma agência de publicidade e precisasse fazer uma foto com o tema “O Século XXI”, e me procurasse querendo um referencial, não titubearia em indicar um diretor de cinema competente e americano (sim existe!), o documentarista Michael Moore.

De seu criativo jeito de ver a vida, resultaram documentários importantes e geniais, do calibre de “Roger & Eu”, “Tiros em Columbine” e “Farenheit 11 de Setembro”. O trabalho do gordo de boné fizeram a mídia respeitar um dos gêneros de cinema mais deixados de lado dos últimos 30 anos, o documentário.

Em “Sicko” ele, mais uma vez, pressiona uma das maiores feridas do “American Way of Life”, os planos de saúde. Com uma edição primorosa e uma produção estudada Michael demonstra que dinheiro sempre vem em primeiro lugar no paraíso capitalista Yankee. E nem vale aquele lance de imperialismo, já que na Inglaterra o estilo de programa de saúde desempenhado pelos súditos da coroa é mais humano que o que encontramos até mesmo no Brasil.

Uma cena é fundamental para que os americanos, como sempre em um filme do diretor, tenham vergonha de suas eternas más impressões quanto aos estrangeiros e seus governos: um grupo de pessoas – “heróis de 11 de Setembro” - é levado por Michael para a ilha de Fidel para serem tratados, de forma gratuita, de seus males – já que o governo americano não os ajudou em nada. Nota 9,0.


“Eu Não Estou Lá” – Hoje são poucos os diretores autores que me fazem ir ao cinema. Devem existir uns 20 nomes no máximo que conseguem tal feito. Um deles com certeza é o Tod Haynes.

É dele uma seqüência de filmes em que teve total comando da obra que merecem ser conferidos e até mesmo adquiridos de forma automática: a biografia não autorizada de David Bowie “Velvet Goldmine” (fora de acervo), o drama tenso e belo “Longe do Paraíso” (à venda as pencas nas locadoras do centro a preço de banana) e o também biográfico e interessantíssimo “Eu Não Estou Lá” (que acaba de chegar às locadoras).

Em todos os seus filmes, Tod investe no cinema de arte sem soar bobo ou muito inteligente, longe disso, ele se preserva o direito de dar total liberdade aos seus interpretes, para que o filme ganhe vida cena a cena e com todos os elementos artísticos necessários. É fácil ver seus atores desaparecerem em cena e darem vida tocável a elementos que não existiram – até aquele momento.

Foi assim com seus protagonistas – Christian Bale, Ewan McGregor e Jonathan Rhys-Meyers - em “Velvet”, também com seu elenco – Juliane Moore, Dennis Quaid e Dennis Haysbert - em “Longe” e se aprimorou de tal forma em “Eu Não Estou Lá” que com certeza Tod não terá dificuldades em ter grande elenco nas mãos ao realizar seu próximo filme.

Como falar de um ser tão diferente e ao mesmo tempo tão igual como Bob Dylan? Fácil: distribuindo sua personalidade em vários personagens diferentes, mas com ligações tênues e visíveis.

Assim temos o trovador ingênuo que queria ser de um tempo que não lhe pertence (atuação brilhante do garoto Marcus Carl Franklin), o roqueiro rebelde e que depois se torna um pastor com dom especial (duplamente interpretado pelo sempre competente Chris Bale), o pseudônimo do artista que se vê, mas não se reconhece (Ben Whishaw), o veterano pistoleiro que baleava mal-feitores com seu violão e que abandonou tudo (interpretado por Richard Geere), o elétrico cantor que desfez de sua principal característica e não liga para o que falam dele (o melhor papel de Cate Blanchet no ano passado) e o roqueiro traidor que quer ser ator e não passa de um ser humano ridículo – ou seria comum? (mais um trabalho incrível de Heath Ledger, esquecido pro premiações).

Filmão, com direito a uma bela pergunta, frase retirada da mais conhecida canção de Dylan, ao subir dos créditos: “How Doesn’t Feel?”. Nota 9,0!