!!Com a ajuda de quantos bons amigos Fincher criou este excelente filme? A Rede Social!! Por Rod Castro!

31 de dez. de 2010

Recentemente falei aqui no A Sétima o quanto comparações fazem mais mal do que bem quando a questão é a análise de um filme. Uma obra (filme) é trabalhada de forma única, mesmo que ela em sua estrutura lembre algumas outras - e isso é mais do que normal quando notamos que a mídia em que ela foi produzida, no caso o cinema, possui mais de um século de vida.

Também por aqui, já falei o quanto aprecio o trabalho do diretor norte-americano David Fincher. De todos seus trabalhos em cinema, somente dois não me são bem quistos: “Alien 3” – que recebeu cargas massivas de intromissão de engravatados da 20th Century Fox - e o “thriller” “Quarto do Pânico” – lento, chato e com uma trama pífia.

Seus demais filmes sempre figuram em alguma lista organizada por este escriba. É impossível falar de cinema nos anos 90 e deixar “Se7en”, “Vidas Em Jogo” e “Clube da Luta” de fora. Assim como seria impossível não citar o belo “O Curioso Caso de Benjamin Button” e o neoclássico “Zodíaco”.

Mas confesso que Fincher deu um passo a mais em seu novo filme, um dos melhores do ano com certeza, “ A Rede Social”. Este movimento já havia sido ensaiado em outros bons filmes sobre seu comando, mas agora teve um resultado bem mais forte: ele descobriu o verdadeiro papel de um diretor.

Como assim?

No curso de cinema que faço, conversei com um dos meus professores e perguntei qual era a visão dele do papel de um diretor em um filme, ele me deu a resposta que sempre pensei ser a mais interessante:

“o diretor tem que ser como um árbitro num jogo de futebol. Não deve aparecer mais que o jogo e fazer o espetáculo fluir. E lembre-se: o erro faz parte do trabalho.”.

Com “A Rede Social” o ex-fazedor de clipes e comerciais, Fincher, realmente provou que sabe do que faz. Ele apenas vê, com olhar privilegiado e mostra com singela genialidade o seu filme para milhões de espectadores.

E o que torna “A Rede Social” um filme a ser admirado?

A diferença não está no ritmo lento dado em certos momentos, como já li em alguns sites, muito menos na quantidade de cortes – que segundo muitos o diretor teria diminuído (conte quantos cortes ele dá somente na cena em que Mark Zukeberg cria o Face Mesh e veja se ele realmente diminuiu o seu ritmo de contar uma história) e nas escolhas de ângulos ou estilo de câmera.

Ela reside no conjunto e no hábito de ter uma equipe boa em vários aspectos sob um comando experiente e até mesmo clássico de trabalhar que o diretor finalmente adquiriu – talvez seja mais o peso da idade do que meras preferências.

Técnicamente consigo enxergar filmes mais interessantes que “A Rede Social” neste ano de 2010, confira: a edição de “A Origem” e de “O Mundo Contra Scott Pillgrim” são superiores. A direção de arte do “Dr. Parnassus” é insuperável, assim como a trilha sonora de “A Origem”.

Mas em um quesito, um, o filme de Fincher deixa os demais para trás e isso é fato: seu elenco, afiado, sem exageros e o mais competente em ritmo de texto falado dos últimos anos e isso, ao contrário do que muitos afirmam, há muito de Fincher.

Teu passado te condena

Ter personagens falando intensamente textos afiados não é novidade na carreira de Fincher – que veio da publicidade/videoclipes. Dois de seus melhores filmes possuem diálogos marcantes sempre ditos por personagens principais.

John Doe (Kevin Spacey que é o produtor executivo de "A Rede Social") em determinado momento de “Se7en”, em que está levando os detetives para o deserto, fala um texto imenso, intenso e memorável; em dezenas de momentos Tyler Durden (Brad Pitt), em “O Clube da Luta”, fala palavras de protesto em textos gigantes em um enquadramento sombrio – tanto na cor (direção de arte) quanto no movimento (direção de fotografia).

Seria impossível afirmar que o elenco do filme tem o brilhante desempenho sem ter recebido uma bela colaboração de seu comandante maior.

Dupla Explosiva

Assim como em “Se7en”, também em “O Clube da Luta”, até mesmo em “Quarto do Pânico”, “Zodíaco” e “O Curioso Caso de Benjamin Button”, DF aposta com afinco em uma dupla de protagonistas – o já falado Zuckerberg e seu amigo brasileiro Eduardo - que contará a história do início ao fim.

A visão dessas pessoas será a mesma que teremos do início até antes dos momentos finais, isso porque o elemento surpresa surge e podemos notar algo de diferente do que já nos foi mostrado – como o aparecimento de Doe e a famigerada Marla.

Em “A Rede Social” não é diferente. O personagem falastrão e dono de “todo o conhecimento do mundo” é Sean Parker (criador do Napster) – interpretado pelo competente Justin Timberlake.

Mas que tal falarmos do que as pessoas que vão ao cinema realmente querem saber: a trama.

O filme

Mark Zuckerberg (magistral atuação de Jesse Eisenberg) é um nerd que não sabe lidar com a namorada nem com as pessoas que o cercam e em um rompante – ele leva um fora da namorada que já não aguenta mais seu jeito “acima de todos” de ser – cria, com a ajuda de alguns amigos, em especial o brasileiro Eduardo (Andrew Garfield, futuro Peter Parker) um site que compara as moças dos mais variados cursos de sua faculdade. Tal programa faz tanto sucesso que Mark derruba o sistema local de computadores e se torna uma lenda.

A fama o leva ao encontro de dois irmãos esportistas (interpretados pelo excelente Armie Hammer) e um nerd que o convocam para a criação de um novo site de relacionamentos exclusivo para os alunos de Harvard.

O que se vê a partir deste ponto é: como o Facebook foi criado; como o relacionamento entre Mark e Eduardo degringola; como os irmãos foram enganados por Mark; como a fama atraiu todo tipo de gente para perto dos verdadeiros criadores, desde fãs da faculdade, passando por meninas que eles nunca teriam a menor chance de ter algo, chegando ao derradeiro encontro com o soberbo Sean Parker; e como, novamente, Mark enganou o seu verdadeiro e único amigo “Duardo”.

Em meio a tudo isso, o passado, podemos ver o presente: em que Mark responde ao processo movido pelos irmãos e Eduardo. Uma trama simples e ao mesmo tempo complexa.

Este novo filme cutuca uma ferida que Fincher vem pondo o dedo há um certo tempo: a distância.

Em um click: um amigo. Em outro: um bloqueio.

O elemento distância está presente no olhar vago e até mesmo cansado do detetive Somerset em “Se7en”, faz-se de forma engraçada (Bob) reflexiva (Jack) e sinistra (Tyler) em o “Clube da Luta” e ganha vida na obstinação do Inspetor David Toschi (Mark Ruffalo em “Zodíaco”).

Este mesmo elemento surge de forma mais alarmante em "A Rede Social" e infelizmente parece fazer parte somente da vida de um personagem, mas não assim. Mark realmente é a distância em pessoa. Mas Eduardo se torna distante com o passar do tempo e mais ainda ao perceber no que havia se metido. Os gêmeos se distanciam até mesmo de seus preceitos para conseguir a tão esperada fama e Sean Parker paga um preço alto por se achar um gênio revolucionário.

Essa transformação é o principal objetivo que Fincher e sua equipe tentam mostrar: o que é verdadeiro hoje em dia? O que é a distância? Como você pode passar por cima de amizades e até mesmo conceitos, para se tornar famoso ou receber o que sempre sonhou, mesmo que não seja de uma forma concreta?

Este filme é a cara desta geração: que se importa com o outro sim, desde que o mesmo lhe renda cifrões, concordâncias ou elogios. Um dos melhores filmes do ano, nota 10.

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