!!A Necrofilia da Arte!! Por Marco Antonio Ribeiro

30 de jun. de 2009

A necrofilia da arte
tem adeptos em toda parte
a necrofilia da arte
traz barato artigos de morte
Se o Lennon morreu, eu amo ele
Se o Marley se foi, eu me flagelo
Elvis não morreu, mas não vivo sem ele
Kurt Cobain se foi, e eu o venero
A necrofilia da arte
dá meu endereço a quem não gosto
a necrofilia da arte
faz compreender quem não conheço
Zunfus Trunchus que eu nem conhecia
virou meu star no outro dia


Com a morte do mega astro Michael Jackson, impossível não lembrar da divertida, sarcástica e absolutamente realista letra Rubinho Troll, gravada pelo Pato Fu, acima para seu deleite. É um fato que a morte vende e que a exposição na mídia faz defunto render mais que quando estava vivo e até conquistar novos fãs.

Em relação ao mais novo presunto famoso, posso dizer sem medo de ser feliz que o senhor cinqüentão já havia perdido, há mais de vinte anos, sua relevância no meio artístico. Depois de Bad, seu trabalho mediano pós o hiper-mega clássico Thriller (apesar de eu preferir, de longe, o anterior Off The Wall), Jackson se tornou uma caricatura de si próprio, uma espécie de freak show que cantava e dançava nas horas vagas.

Porém, com a sua partida para a nave mãe (sim, diziam que ele era um ET), seus discos encalhados começaram a brotar nas prateleiras. Em rápida consulta em sites, praticamente todos os álbuns que estavam fora de catálogo passaram ao status de pré-venda, ou seja, a indústria fonográfica lamentou muito a morte do astro mas comemora as vendas para atender aos fãs de última hora (literalmente) que não tinham nada do ex-integrante dos Jackson Five mas que, com a sua morte, querem uma espécie de souvenir do fatal ocorrido.

Mais ou menos o que aconteceu com outro rei. O do rock. Em 1977, quando os alienígenas vieram buscar Elvis Presley (sim, ele também), o cara estava em uma decadência física e criativa que até os mais ardosos fãs ficavam constrangidos. Quando ele deixou de ser rei? Dizem que foi quando começou a fazer cinema e passou o comando de sua vida e arte para as mãos de um tal coronel Tom Parker, que não é avô do Homem Aranha. Elvis pode não ter morrido fisicamente (tem gente que jura tê-lo com sandálias de dedo e camisa havaiana) mas, artisticamente, faleceu por volta de 1958.

No Brasil, outro rei, o da Jovem Guarda taí, vivo mas totalmente sem importância para o cenário musical, fazendo seus showzinhos em cruzeiros para embalar a velharada religiosa ou mesmo para os que lembram como ele (Roberto) foi um artista revolucionário na década de 60, quando desafiava, com sua guitarra estridente, os riquinhos do banquinho e violão, criativo e provocador na década de 70, quando incorporou a soul music na sua obra ou até mesmo nos 80, quando a chama ainda brilhava, Ele era uma brasa, mora? Mas a brasa apagou faz tempo e virou cinza.

Triste dizer mas artistas como Jackson, quando vão para a terra dos pés juntos, são lembrados pelo passado longínquo e não pela obra mais recente. Quer ver? Quando Chico Buarque, Caetano Veloso ou Gilberto Gil partirem desta para melhor, vão ter aqueles especiais globais, as coberturas de velório, repórter idiota perguntando de algum parente ou amigo se a família está triste (vi isso na cobertura do acidente com os Mamonas Assassinas e até hoje tenho pesadelos), depoimentos de famosos dizendo o quanto o falecido foi importante em suas vidas, que começaram a cantar por causa dele, etc e tal. E sabe quais as músicas que vão servir de trilha para os especiais póstumos? Sim, as velharias. E tome A Banda, Sampa, Não Chore Mais, e por aí afora.

Dos brazucas citados, apenas Caetano continua (tentando, pelo menos) manter sua verve criativa e foge do convencionalismo e dos discos para cumprir tabela. Seus últimos dois álbuns são muito bons e espero que, se ele morrer amanhã, suas canções mais recentes sejam citadas junto com as inevitáveis Leãozinho, Menino do Rio e a mencionada no parágrafo anterior.

Outro grande exemplo de astros que mantém firme seu poder de criatividade e inovação é Madonna. Quando se fala nela, pouco se lembra de coisas como Like a Virgin, Papa Don’t Preach ou Holiday. A mulher manda muito bem e seus álbuns estão cada vez melhores. Ela mesma, como ser humano e artista, parece vinho.

Poderia citar Paul McCartney mas a minha condição de beatlemaniaco não me permite fazer um comentário sem estar emocionalmente envolvido com a obra do ex-beatle, que é toda indispensável.

Enfim, a conclusão que se pode chegar é que, em matéria de cifrão, certos artistas são mais viáveis comercialmente quando são atingidos pela foice da senhora morte. Tudo armado por um circo macabro sustentados por fãs que só se interessam pelos (falecidos) ídolos quando ocorre a fatalidade suprema ou quando a globo resolve fazer uma minissérie (vide a recente Maysa). Então, pra você que tem uma banda, gravou alguns CDs mas não vende nada, fica a dica: morra.

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